27 abril, 2006

prece



Que eu caminhe sobre as águas celestes,
Que eu honre o brilho do sol,
Como luz do meu Olho...
Eu sou o Grande Deus,
Vindo à existência por si mesmo,
Eu componho os meus nomes,
Ontem pertence-me,
Eu conheço o amanhã,
Eu sou a Fénix,
Não há impureza em mim,
Eu conheço o caminho,
Eu vou para a ilha dos justos,
Eu chego ao país de luz,
Eu reconstituo o Olho,
Eu vejo a luz...
Eu sou um desses espíritos
Que habitam a Luz,
Que o próprio Áton criou,
Que vieram à existência,
Da raiz do seu Olho.
Eu sou uma dessas serpentes
Que criou o Olho do Mestre Único.
Eu crio o Verbo,
Eu resido no meu Olho.

Livro dos Mortos, cap. 64, 17, 78.

26 abril, 2006

soukha



No budismo, o termo soukha designa um estado de bem-estar que nasce de um espírito excepcionalmente são e sereno. É uma qualidade que contém e impregna cada experiência, cada comportamento, que abrange todas as alegrias e todas as penas. Uma tão profunda felicidade que “nada poderia alterar, como as grandes águas calmas sobre a tempestade”. É também um estado de sabedoria, livre de venenos mentais e de conhecimento, livre de cegueira sobre a verdadeira natureza das coisas.
É interessante observar que os termos sânscritos soukha e ananda, geralmente traduzidos, à falta de melhor, por “felicidade” e “alegria”, não têm verdadeiramente equivalentes nas línguas ocidentais. A expressão “bem-estar” seria o equivalente mais aproximado do conceito de soukha, se esta palavra não tivesse perdido a força para não designar mais do que um conforto exterior e um sentimento de contentamento bastante superficiais. Quanto ao termo ananda, ainda mais do que alegria, designa a irradiação do soukha, que ilumina de felicidade o instante presente e se perpetua no instante seguinte até formar um continuum a que se poderia chamar “alegria de viver”.
Soukha está estreitamente ligado à compreensão da maneira como funciona o nosso espírito e depende da nossa maneira de interpretar o mundo, porque se é difícil mudar este último, é, em compensação, possível transformar a maneira de o perceber.
(...) O contrário de soukha é expresso pelo termo sânscrito doukha, geralmente reduzido por sofrimento, desgraça ou mais precisamente “mal-estar”. Não define uma simples sensação desagradável, mas reflecte uma vulnerabilidade fundamental ao sofrimento, que pode ir até à falta de vontade de viver, ao sentimento de que a vida não vale a pena ser vivida dada a impossibilidade de se lhe descobrir o sentido. É o herói de Satre que em A Náusea vomita estas palavras: “Se me tivessem perguntado o que era a existência, teria respondido de boa-fé que não era nada, simplesmente uma forma de vazio (...) Éramos um monte de existências afectadas, embaraçadas consigo próprias, não tínhamos a menor razão para estar ali, nem uns nem outros, cada ser existente, confuso, vagamente inquieto, sentia-se a mais em relação aos outros. (...) Também eu estava a mais (...) Sonhava vagamente em suprimir-se, para destruir pelo menos uma dessas existências supérfluas.” O facto de se achar que o mundo seria melhor sem nós é uma causa frequente de suicídio.
Ora, por influentes que possam ser as condições exteriores, esse mal-estar, tal como o bem-estar, é essencialmente um estado íntimo. Compreender isto é o preliminar indispensável a uma vida que valha a pena ser vivida. Em que condições vai o nosso espírito minar a nossa alegria de viver, em que condições a vai alimentar?
Mudar a nossa visão do mundo não implica um optimismo ingénuo, nem uma euforia artificial destinada a compensar a adversidade. Enquanto a insatisfação e a frustração provenientes da confusão que reina no nosso espírito forem o nosso quinhão quotidiano, repetir durante todo o tempo “Sou feliz!” é um exercício tão fútil como voltar a pintar uma parede degradada. A busca da felicidade não consiste em ver a “vida cor-de-rosa”, nem em enganar-se quanto aos sofrimentos e imperfeições do mundo.
A felicidade também não é um estado de exaltação que se deva perpetuar a todo o custo, mas a eliminação de toxinas mentais como o ódio e a obsessão, que envenenam literalmente o espírito. Para tanto é necessário adquirir um melhor conhecimento da maneira como funciona este último e uma percepção mais justa da realidade.
(...) Em resumo, soukha é um estado de plenitude duradoura que se manifesta quando nos libertamos da cegueira mental e das emoções conflituosas. É também sabedoria que se permite perceber o mundo tal como ele é, sem véus nem deformações. É por fim, a alegria de caminhar para a liberdade interior e a bondade afectuosa que irradia para os outros.

in Em Defesa da Felicidade, Matthieu Ricard; Pergaminho



Mathieu Ricard é filho do filósofo francês Jean-François Revel. As suas principais credenciais científicas incluem o doutoramento em Genética Molecular, obtido no Instituto Pasteur, em Paris, e o trabalho que desenvolveu sob a direcção do Prémio Nobel François Jacob. Posteriormente abandonou a investigação científica para se tornar monge budista tibetano nos Himalaias. Desempenha as funções de secretário particular e intérprete de S.S. o Dalai Lama.



Soukha foi o nome que escolhi para este blog.
É, numa palavra, o meu caminho. É o sentido, a orientação que quero ter, ser e dar à minha vida.
Não sou budista. Sou o que eu sou e abraço todas as culturas e tradições que, pelo seu espírito universal, me proporcionam o conhecimento que considero fundamental para vencer e superar a minha própria ignorância, causa única e última de qualquer mal-estar ou infelicidade. Li este livro de coração aberto, disponível. Terminei-o com a emoção, alegria e comoção de quem recebeu uma prenda inestimável. Chorei. Chorei de alegria. Sou muito grata ao autor e à minha querida I., quem mo emprestou. Estou grata porque quem o escreveu fê-lo por amor, com amor e quem mo colocou nas mãos fê-lo da mesma forma. Amor gera amor. Ainda não escrevi nenhum livro... vou escrevendo folhas. Folhas de soukha, de mim para mim, de mim para quem queira receber. Obrigada a quem me lê e obrigada a quem me responde - tenho recebido imenso, e sei, estou mais rica. Obrigada.

Tem dia muito feliz.

20 abril, 2006

Fazer paz com paz



A favor da paz no Bioterra

Comecei este blog a falar da paz. Foram os meus primeiros posts.

Acredito que a paz se faz com paz, com a nossa própria antes de mais e que, por isso, esse é o primeiro passo: encontrar a paz interior, desenvolvê-la e ampliá-la.

Duvido que possa fazer-se paz com insultos, com revolta vã, com indignação apenas, ou com desassossego. Por piores que sejam os nossos inimigos externos - aqueles a quem apontamos o dedo por todas as atrocidades - os nossos piores inimigos estão dentro de nós. São a nossa revolta, ira, ignorância, intolerância, falta de benovolência, raiva, medo, angústia, insegurança, etc. Não vou repetir-me. Quem quiser pode ler agora. É apenas um longo texto... escrevi outros. Parti daí, aliás.

Para a minha concepção de paz, da paz e de como ser uma fazedora de paz, muito contribui a visão de Deepak Chopra.

Aqui fica a sua receita, para todos os dias:

Domingo: Ser paz

Segunda-feira: Pensar paz

Terça-feira: Sentir paz

Quarta-feita: Falar paz

Quinta-feira: Agir paz

Sexta-feira: Criar paz

Sábado: Partilhar paz

Hoje é dia de Agir Paz... esta é a minha acção!

19 abril, 2006

em nome do Amor



Não existe nada fora de ti, que não exista dentro de ti.
Não existe nada que busques fora de ti, que não possas encontrar em ti próprio.


Se buscas o amor, compreende que é em ti que ele se manifesta. Entende que a tua vontade de ser amado é a ânsia do amor que falta em ti próprio, por ti próprio e que procuras suprir através do amor que esperas receber dos outros. Percebe que tu és o grande fazedor, operador, dador e receptor de amor na tua vida. Não entregues a realização do amor, na tua vida, nas mãos dos outros. Não peças, não esperes. Dá e oferece, tal como gostarias que te fosse dado e oferecido. Não exijas de ninguém aquilo que ainda não obtiveste de ti: amor incondicional.




Não confundas amor-próprio com vaidade, com arrogância. Por detrás da vaidade há sempre vergonha, insegurança. A vaidade é outro nome para afirmação sublinhada, enfatizada. Só precisa impor-se quem se move na dúvida, quem duvida de si próprio. O amor não esconde nada nem revela nada. O amor é uma energia e por isso serve apenas para pôr em marcha, para criar movimento, acção. És tu, e não o outro, a única central energética que produz o amor que alimenta a tua vida, te alimenta a ti e aos que te rodeiam. Ser amado é uma resposta e um resultado da relação causa efeito – o que vai volta. Ama e, sem dúvida alguma, serás amado. A vida opera, sem esforço, o justo e eterno retorno de tudo aquilo que é gerado e posto em marcha.



Amar não é ser bonzinho. Amar é agir com amor, movido por amor, por benquerença, a ti e ao outro. É também dizer “não”, deixar ir, partir e, muitas vezes, renunciar. Amar é antes de mais libertar, a ti e aos outros das condições que colocamos, tantas vezes, no exercício de amar – amar só quem nos corresponde, dar tendo em vista aquilo que queremos obter, possuir para sentir segurança, sacrificar e sacrificar-se como provas de amor.
Amar é iluminar e aquecer como a luz do Sol. É dar, indiferenciadamente, sem expectativas nem julgamentos. Amar é brilhar, gerar luz, calor, força. Amar é auto-gerar essa energia e perceber que o amor é uma responsabilidade exclusivamente nossa – que somos responsáveis por gerar essa energia nós próprios, em nós próprios, por nós, para nós e para os outros.




Por isso aceita-te, mima-te, cuida de ti. Perdoa a tuas falhas, os teus erros e todos os teus fracassos. Aprende com eles. Não há prémios nem castigos, apenas experiências. Compromete-te contigo próprio a amares-te incondicionalmente, antes de te comprometeres com o outro ou a exigires dele esse compromisso.
Amar é perdoar. Amar é aceitar. Aceita-te tal como és e ao outro tal como ele é. E, antes de julgares que a tua vida poderia ser bem melhor se o outro mudasse, pensa no quanto poderias fazer por ti e pela tua vida se tu próprio mudasses. Supera-te antes de pedires a alguém que se supere por ti, para teu benefício. Tu és a única pessoa sobre a qual podes agir e sobre a qual deténs o poder da transformação.
Por amor, olha para dentro. Por Amor...

18 abril, 2006

vontade




Apetece-me mergulhar no Oceano
e tocar o fundo do céu.

Apetece-me flutuar entre as estrelas,
boiar na luz da lua cheia,
agarrar-me ao dorso de certos cometas
e cortar as ondas das órbitas dos planetas.

E depois, num fôlego profundo,
vir à superfície,
só para encher o pulmões com o brilho do sol.

Ai, apetece-me tanto nadar na Via Láctea.
Será loucura ter uma vontade assim?


17 abril, 2006

Obrigada!!!!!


foto*

Tão bom receber flores!

Obrigada Jardineira Aprendiz

e suas mãos que trabalham as Cores da Terra

13 abril, 2006

Páscoa



Sou a semente do trigo e a planta da videira,
Sou o campo e o camponês.
Sou a terra lavrada, o tempero e a colheita.

Sou o trigo e sou a uva,
a ceifa e a ceifeira.

Sou o celeiro, o moinho e o moleiro.
Sou o vento que sopra nas velas,
e a mó que esmaga o grão.

Sou a adega e sou a pipa.
Esmago-me no cacho... e escorro.
Fermento no pão, fermento no vinho,
eu sou a levedura que repousa.

Sou o cesto e sou a taça,
Sou o pão e sou o vinho.

E porque também toda a minha fome,
é fome daquilo que eu sou,
Tão bendita é a fome quanto o manjar:

Pão e vinho, na minha mesa.

Àquele que venceu a morte com Amor, por Amor.

12 abril, 2006

Ostara-Eostre-Easter

Easter, Páscoa em inglês, deriva do nome da Deusa Eostre, ou Ostara.
Eostre, deusa anglo-saxónica da fertilidade, era (e é ainda) celebrada no Equinócio da Primavera com danças e festejos ao ar livre, no campo. Saudava-se assim a chegada da Primavera, época da fertilidade e ressurgimento da vida por excelência depois do longo Inverno.
Os símbolos associados a Eostre são o Ovo, a Lua e o Coelho, seu animal sagrado.



ilustração
O ovo e a lua, bem como o coelho são formas de dizer a fertilidade em analogia e correlação com a Natureza. É um facto que, mesmo nós mamíferos, devemos a nossa concepção à fecundação do ovo (óvulo) e que os ciclos de fertilidade feminina e da Natureza estão intimamente ligados aos ciclos do Sol e da Lua. Assim, os festejos em honra de Eostre são uma forma de dar as boas-vindas ao Sol que, por este época, se sobrepõe à noite, despertando a Natureza para esta fantástica explosão de vida.


A Lua, ovo universal, liga-se ao óvulo feminino e ao ciclo menstrual, bem como à própria evolução fecunda da vida e da Terra, sempre em eterno movimento e alternância cíclica: desde a jovem virgem - a que ainda não foi mãe; passando pela forma adulta - a mãe que concebe e faz nascer, terminando na anciã e sábia, para voltar de novo ao princípio.
A celebração da Páscoa cristã decalcou os festejos dedicados a Eostre e absorveu os seus símbolos: os ovos e amêndoas (a forma oval é por de mais evidente) e os coelhinhos da Páscoa. Sobre os coelhos, a sua simbologia associa-se à fertilidade, e deve-se fortemente ao facto de serem animais que criam as suas generosas ninhadas em tocas (no interior da terra). Ilustra-se assim o renascimento da vida a partir de um estado embrionário, de recolhimento, a qual emerge do subsolo, numa afirmação de vitória sobre a escuridão do Inverno. A própria deusa Eostre, segundo algumas versões que relatam o mito, nasceu de um ovo incubado no solo e que
eclodiu da própria terra, em analogia com a vegetação e animais que, após o período de hibernação, saem para o exterior.

foto


A Páscoa cristã, muito embora coloque o acento tónico na morte e sofrimento de Cristo, apela também à celebração do eterno retorno da vida, do renascimento e ressurreição, a qual supera e vence a morte física. É ainda, e desde sempre, uma festa calculada segundo os ciclos do Sol e da Lua em relação à Terra. O Domingo de Páscoa é sempre o primeiro Domingo depois da Lua Cheia imediatamente a seguir ao Equinócio da Primavera. Extraordinário é (ou não) que, apesar de todos os esforços conduzidos pela Igreja Católica para apagar da memória colectiva esta celebração, a “festa” de Eostre permaneça viva. Tão extraordinário quanto o é a intuição latente que nos liga à Natureza, a qual, nem os tempos nem a tirania dos homens pode apagar. E muito embora a Tradição tenha ressurgido (porque de facto nunca morreu), a verdade é que, nem mesmo àqueles que pouco ou nada sabem de deuses pagãos escapa esta alegria de estar na Primavera!

Entenda-se que o Pensamento dos Antigos, o qual elevava a Natureza a uma ordem divina através da representação mitológica e expressa pelo rito, compreendia uma leitura: tudo na Natureza é sagrado.

Muito a propósito, aqui fica a pertinente recomendação da Greentea

11 abril, 2006

Olhos que brilham



A ciência sem religião é coxa, a religião sem ciência é cega”
Albert Einstein




“Enquanto não atingires um perfeito conhecimento
daquilo que procuras, através de experiências repetidas,
pacientes e evidentes, a Natureza não te convidará
a sentares-te na sua mesa sumptuosa”

Raymond Lulle






“Porque o ouro não é um metal, o ouro é a luz...O ouro é o sol; fazer ouro é ser um deus”
Vítor Hugo



Acender o fogo que transforma a matéria e o espírito,
respirar profundamente das inspirações que alimentam o crepitar da chama
e encher-se de luz e de ouro... desse ouro que se revela no inexplicável brilho do olhar...






Para humanizar a Humanidade,
a descoberta do Fogo está ainda por acontecer










fotos daqui

10 abril, 2006

quem canta seus males espanta


Foto retirada da Internet
... ouvir com outros ouvidos esta música imperdível AQUI

Obrigada Eve On The Clouds

06 abril, 2006

pluma de avestruz


Maat e Hathor

Pesar todos os dias o coração na Tua balança
e verificar se pesa.

Tem que estar leve,
Leve como a Pluma, matéria da qual é feito o Teu nome.

Visitar a constelação:
Verdade
Justiça
Equílibrio
Harmonia

Perguntar, inquirir.
Voltar a verificar,

Se pesa,
Se me pesa.


Maat

Estar erguido
e sentir a firmeza da rectidão percorrer a medula,
inteira, intacta, erecta.
E, por isso, só por isso, ficar com o coração tão leve
como uma pluma de avestruz.

04 abril, 2006

tu és isso



Há milhares de anos, o grande sábio Uddalaka Aruni enviou Svetaketu, o filho de doze anos, para junto de um ilustre guru para que o rapaz pudesse aprender profundamente a realidade última. Durante doze anos, Svetaketu estudou com o seu mestre, tendo memorizado todos os Vedas. Ao voltar a casa, o seu pai reparou que ele agia como se tivesse aprendido tudo o que havia para aprender. Por isso, Uddalaka decidiu fazer uma pergunta ao jovem.
- Meu instruído filho, que coisa não pode ser ouvida, mas torna audição possível, não pode ser vista, mas torna a visão possível, não pode ser conhecida, mas torna o conhecimento possível, e não pode ser imaginada, mas torna a imaginação possível?
Svetaketu ficou perplexo e em silêncio.
O seu pai afirmou: “Quando conhecemos uma única partícula de barro, todos os objectos de barro são conhecidos. Quando conhecemos um único grão de ouro, todos os objectos de ouro são conhecidos. A diferença entre duas peças de joalharia em ouro está apenas no nome e forma. Na verdade, toda a joalharia é apenas ouro, e todos os potes são apenas barro. Consegues dizer-me, meu filho, que coisa é essa que, por ser conhecida, torna tudo conhecido?”
- Infelizmente o meu mestre não me deu esse conhecimento. Dais-mo vós? Disse Svetaketu.
- Muito bem – acedeu Uddalaka – Deixa-me que to diga. Todo o universo é uma realidade e essa realidade é consciência pura. A consciência pura é existência absoluta. É Um que não é seguido de um Segundo. No início, o Um disse para consigo: “Diferenciar-me-ei nos muitos e assim surgirão todos os espectadores e todos os cenários.” O Um entrou nos muito e tornou-se o Eu de cada um. Os seres de todas as coisas são o Um, e esse um é a essência subtil de tudo o que existe. Tu és isso, Svetaketu.
E continuou, “Desta forma, as abelhas produzem o mel a partir do néctar das flores, mas assim que o mel estiver pronto, o néctar não pode dizer: ‘Eu venho desta flor e tu daquela’. Também aqui, quando te fundes com o teu Eu não-local, tornas-te um só com o Eu de tudo o que existe. Este é o verdadeiro Eu de todos, e, Svetaketu, tu és isso.”
O jovem pediu, “Esclarecei-me mais, meu pai.”
Uddalaka fez uma pausa antes de prosseguir.
- O rio Ganges corre para leste. O rio Indo corre para Oeste. Contudo, ambos acabam onde por se tornar mar. Tendo-se encontrado no mar, eles deixam de pensar “Eu sou o Ganges”, ou “Eu sou o Indo”. Por isso, meu filho, também tudo o que existe tem o seu manancial no Eu não-local, e esse Eu é a essência mais subtil de tudo. É o Eu verdadeiro. Svetaketu, tu és isso.
“Quando o corpo definha e morre, o Eu não falece. O fogo não consegue consumi-lo, a água não consegue molhá-lo, o vento não consegue secá-lo, as armas não conseguem trespassá-lo. É vindouro, não tem princípio nem fim. Está para além das amarras do espaço e do tempo, impregnando todo o universo. Svetakeru, tu és isso.”
- Esclarecei-me mais, meu pai – insistiu Svetakeru cheio de entusiasmo.
Uddalaka disse, “Traz-me um fruto de uma árvore nyagrodha.
Svetaketu trouxe-lhe o fruto.
- Abre-o ao meio.
Svetaketu abriu-o.
- O que vês tu, meu filho?
- Minúsculas sementes, meu pai.
- Agora, abre uma delas.
Svetaketu abriu uma pequena semente.
- o que vês tu, meu filho?
- Vejo que nada restou, meu pai.
- Aquilo que não vês é a essência subtil, e toda a árvore nyagrodha provém dela. Assim como todo o universo emerge do Eu não-local.
Por fim, Uddalaka pediu a Svetaketu que colocasse um cubo de sal numa selha com água. No dia seguinte, o sábio pediu ao filho que lhe devolvesse o cubo de sal.
- Não posso devolver-lho – respondeu o jovem – Dissolveu-se.
Uddalaka pediu ao filho para provar a superfície da água.
- Diz-me como está?
- Está salgada, meu pai.
- Prova-a no meio e vê como está.
- Está salgada, meu pai.
- Prova-a no fundo e diz-me como está.
- Está salgada, meu pai.
- Tal como o sal está localizado no cubo e disperso na água, também o teu Eu está simultaneamente localizado no teu corpo e impregna todo o universo.
“Meu querido filho”, continuo Uddalaka, “não distingues o Eu no teu corpo, mas sem ele, as percepções não seriam possíveis. Não podes conceptualizar o Eu, mas sem ele a sua conceptualização não seria possível. Não consegues imaginar o Eu, mas sem ele a imaginação não seria possível. Contudo, quando te tornares o Eu e viveres ao nível desse Eu não-local, ficarás ligado a tudo o que existe, porque o Eu é o manancial de tudo o que existe. Verdade, realidade, existência, consciência, absoluto... chama-lhe o que quiseres, é a realidade última, o território de todos os seres. Tu és isso Svetaketu.
“Parte desse nível, Svetaketu, e todos os teus desejos se tornarão realidade, porque a partir desse nível eles não só serão os teus desejos pessoais, como estarão alinhados com os desejos de tudo o que existe.»
Svetaketu pôs em prática tudo o que aprendera e tornou-se um dos maiores visionários da tradição védica.




Esta história foi retirada de um dos mais importantes textos vedânticos, o Chandogya Upanishad, e publicada por Deepak Chopra em Os sete princípios da realização pessoal.
Esta história descreve de forma admirável a natureza do Eu; daquilo que eu sou e daquilo todos nós somos. Não se trata de um dogma de fé, trata-se, antes de mais, de uma experiência, a qual se desdobra em pequenas e grandes descobertas e num sentimento de pertença inigualável.

Sei hoje que não sou portuguesa, europeia ou mesmo uma cidadã da terra ou do mundo. Sei hoje que sou do Universo! Somos todos!
No topo deste blog, no subtítulo está “Uma árvore, um Pomar, o meu País”. O meu país é o universo e cada árvore é um coração-consciência. Estamos cá para crescer como árvores, para cima, para abraçar o Sol. Estamos cá para abrigar, perfumar e dar frutos. Estamos cá para realizar vida, amor e abundância! Estamos cá para Ser.
Obrigada a todos os que largam aqui as suas sementes e obrigada a todos os que me permitem colher dos seus ramos. Obrigada a todos!